quinta-feira, 22 de abril de 2021

Os escritos e os fatos

Victor Serge 

Este é o segundo artigo de Victor Serge - sobre a sublevação de Kronstadt em 1921 - que traduzo e disponibilizo neste blog. Foi publicado no dia 25 de outubro de 1937 (portanto, 45 dias depois do anterior). Diferentemente do outro, este se compõe de três notas, cada qual com título próprio. Talvez, por isso, no livro que estou tomando como base (ver após a tradução), o editor tenha dado como título da publicação o nome da coluna que os abriga em Révolution Prolétarienne : « Les écrits et les faits » (Os escritos e os fatos), coluna de crítica política escrita por Victor Serge a partir de 1936. A Lutte Ouvrière é a publicação do Partido Operário Internacionalista (Parti Ouvrier Internationaliste), fundado em 1936, secção francesa do Movimento pela IVª Internacional e, a partir de 1938, da IVª Internacional. Nesta tradução, os termos entre colchetes são meus.

Veja também: 

 

Kronstadt (Révolução Prolétarienne, 10 de setembro de 1937)

Sobre Kronstadt em 1921 e outros assuntos (Révolução Prolétarienne25 de agosto de 1938) 

Kronstadt 1921. Defesa de Trotsky. Resposta a Trotsky. (La Révolution prolétarienne25 de outubro de 1938) 

Victor Serge e o totalitarismo stalinista (Vídeo em Subversivídeos sobre Victor Serge)

 

Após a infantaria chegar a pé, camuflada de branco, a cavalaria do Exército Vermelho avança. 


Kronstadt 1921

Comentando por sua vez a carta de Leon Trotsky, sobre esse assunto, que eu discutia na Révolution Prolétarienne [Revolução proletária] de 10 de setembro, Lutte Ouvrière [Luta operária] coloca a questão de uma maneira de tal modo unilateral que consegue escamoteá-la completamente. Seria tratar de modo insolente a história e reduzir a uma apologética muito distante de todo o pensamento marxista o trabalho de análise e de reflexão, que cabe a todos nós, se se visse em seu comentário mais do que uma nota apressada redigida, por assim dizer, insensivelmente [sur le marbre]... Lutte Ouvirère escreve:

"A única questão que seria útil responder é esta: a revolução triunfante, mas minada por contradições sociais e econômicas da guerra civil, teve razão ao quebrar movimentos cujo desenvolvimento significava abertura dos partidos à democracia capitalista?" 

Essa não é, evidentemente, a única questão, já que há toda a história do bolchevismo e dos sovietes a conhecer; e isso é quase exatamente o contrário do que os revolucionários sempre se perguntaram, com a inquietude mais legítima, a respeito de Kronstadt. A ditadura do proletariado, exercida pelo partido comunista, teve razão ao reprimir pela força os protestos, as reivindicações, as proposições, as manifestações dos trabalhadores no auge da fome? Poderíamos lembrar que antes de Kronstadt houve Astrakhan. Ela teve razão ao reprimir movimentos que, sob sua égide, pediam apenas a democracia operária? Estou inclinado a pensar que, desde cedo, se pesou a mão, isto é, se abusou de métodos administrativos e militares a respeito das massas e dos dissidentes da revolução. A experiência mostrou que isso franqueou a via ao despotismo burocrático. Há aí uma lição a tirar para se retornar a ideia da ditadura do proletariado (contra os possuidores despossuídos), larga e verdadeira democracia dos trabalhadores.

A Lutte Ouvrière "compreende além disso a ocasião de destruir a lenda que quer que Kronstadt em 1921 tenha sido um imenso massacre. A verdade é outra... ". Outra a verdade, camaradas? Muito bem, diga-a: sejam precisos, indiquem suas fontes... Um massacre não precisa ser imenso para ser abominável e, por definição, antissocialista. Às centenas, senão aos milhares, os marinheiros de Kronstadt foram fuzilados. Três meses depois, ainda saíam das prisões de Petrogrado à noite, em pequenos grupos, para serem executados em porões ou quadras militares. Três meses depois, quando a NEP que eles tinham reclamado estava proclamada, quando sua morte – secreta – não podia servir nem mesmo para intimidação! E não eram brancos...

Toda essa página sombria parece prefigurar um futuro do qual vemos hoje, pois se tornou presente, as trevas. A Lutte Ouvrière lembra que o Xº Congresso do partido [bolchevique, em 1921], inspirado por Lênin, enviou um grande número de seus delegados para o assalto a Kronstadt, mas ela não diz tudo a esse respeito. O Xº Congresso do partido condenará solenemente a Oposição Operária que denunciava desde então as ururpações da burocracia e reclamava mais democracia para os trabalhadores. Pela primeira vez, uma oposição, e que tinha grande razão em vários pontos (Lênin e Trotsky iriam se aperceber disso dois anos mais tarde), estava marcada com um epíteto que não correspondia em nada à sua doutrina (a resolução do Congresso taxa esses bolcheviques de anarco-sindicalistas), ameaçada de exclusão e intimidada pelo envio de seus delegados ao front de Kronstadt. Dybenko, notadamente, foi para lá: ele, que passava por anarquizante.

Releiam a plataforma da Oposição Operária de 1920-21 e pensem que, dezoito meses mais tarde, Lênin, quase no limite de suas forças, proporá a Trotsky um pacto de combate contra a burocracia do partido, cada vez mais insolente. E pensem que, dois anos mais tarde, a Oposição de Esquerda (Trotsky, Preobajenski, Serebriakov, Piatakov, Rakovski) trava seu primeiro combate e será derrotada: já é muito tarde.

Dois dos autores da plataforma da Oposição operária, velhos militantes de um quarto de século da revolução, aprisionados há anos, estão talvez ainda vivos em alguma penitenciária: Chlianikov e Medvedev. Alexandra Kollontai sobreviveu na carreira diplomática...

Contra o espírito de seita

Esses assuntos estão ainda quentes... Essa é uma razão para não tocar neles? Ao contrário. Vinte anos após a primeira revolução socialista vitoriosa, nós nos sentimos vencidos. De uma magnífica vitória dos trabalhadores, vimos nascer, sobre as bases de uma propriedade socialista dos meios de produção, um regime inumano, profundamente antissocialista pelo tratamento que inflige ao homem. Diante desses resultados, as querelas de seitas não devem retomar? E nossos adversários comuns não fazem um jogo de cena?  É fácil (tão bobo) concluir pela falência das revoluções, do marxismo etc.; e fácil aos reformistas dizerem: Ah, se se tivesse seguido os caminhos da democracia! (Como se esses caminhos não tivessem sido seguidos, infelizmente, até o pior limite, em Itália, em Alemanha e em Áustria!). É fácil aos libertários exclamarem: Ah, se tivessem deixado os anarquistas russos fazerem!, enquanto a revolução espanhola vai de derrota em derrota sob nossos olhos, apesar da hegemonia dos anarquistas no movimento operário – e sua boa vontade e sua admirável coragem, que ninguém contestará. Duas palavras pessoais a esse respeito. Os anarquistas frequentemente me reprovaram não ter me levantado suficientemente, na URSS, no tempo de Lênin, contra a repressão ao anarquismo. Essa repressão, sempre a considerei como uma falta, e eu fiz tudo o que pude, em todas as circunstâncias, com tenacidade, para cessá-la ou atenuá-la; mas eu não podia grande coisa. Dever-se-ia melhor compreender agora essas situações, à luz dos acontecimentos da Espanha. Os delegados da CNT ao Congresso extraordinário dos soviets do ano passado não fizeram nada, nada puderam fazer pelos seus camaradas russos perseguidos. A CNT não pôde impedir o estrangulamento do POUM e nem mesmo colocou amplamente a questão do assassinato de [Andrés] Nin. Viu seus próprios membros aprisionados às centenas quando ela participava do poder! Não ignoro, além disso, que ela prepare suas intervenções nos bastidores. Se a CNT não pôde impedir em Espanha a perseguição aos anarquistas, que poderia, na revolução russa, um militante isolado?

Diante de uma tão vasta experiência de vinte anos e mais, eu vejo apenas uma atitude fecunda, aquela da análise crítica e do desarmamento do espírito de seita. Tratar-nos uns aos outros como pequenos burgueses em lugar de estudar, com sangue frio, sob todos os seus aspectos, os acontecimentos de 1921, por exemplo, não conduziria a nenhuma parte. Confrontemos antes de tudo nossos pontos de partida mais sãos com a realidade. As ideias justas não se impõem, mas se as clarifica pelo estudo e pela reflexão, com boa vontade. Os preciosos exemplos que nos aportava a revolução russa estão obscurecidos, sujos, comprometidos pela contrarrevolução burocrática que sequestrou as velhas bandeiras; só as reencontraremos liberando nosso espírito das fórmulas usadas, dos clichês desacreditados, dos ressentimentos de seita ou de pessoas e, sobretudo, da insuportável pretensão ao monopólio da verdade.

Bolchevismo e anarquismo

De um notável artigo sobre as relações, ou antes, o antagonismo total do bolchevismo e do stalinismo (Boletim de Oposição, nº 58-59), essas linhas inéditas:

“O autor discutiu muitas vezes com Lênin a possibilidade de oferecer aos anarquistas partes do território onde teriam podido, de acordo com a população, prosseguir suas experiências sem Estado, mas a guerra civil, o bloqueio e a fome deixaram pouco espaço para semelhantes planos".

Essa teria sido a única solução justa ao problema do anarquismo russo, pois é bem evidente que os camponeses libertários, reunidos sob as bandeiras negras de um Makhno, tinham direito à autonomia tanto quanto qualquer minoria étnica. As ideias dos trabalhadores não têm na revolução um menor direito de cidadania que o sentimento nacional. Mas nenhuma tentativa séria foi feita nesse sentido, a despeito dos acordos tratados com Makhno contra os brancos, e prontamente desrespeitados – em ambos os lados ao mesmo tempo; as maiores responsabilidades devem ser, em todo caso, atribuídos ao mais forte, ao mais bem organizado, isto é, ao governo bolchevique.

A guerra civil, a fome, o bloqueio tornaram realmente impossível uma política de tolerância para com do anarquismo? O movimento anarquista, como todos os outros movimentos de opinião revolucionária, foi completamente abafado pela repressão somente após a vitória [do governo bolchevique na guerra civil] e o fim da fome, quando o poder burocrático começou a se firmar abertamente, de rosto descoberto. Os dissidentes da revolução tiveram a maior liberdade relativa precisamente durante a guerra civil e a fome e não esqueçamos que contribuíram com a vitória dos soviets: Makhno tinha desorganizado a retaguarda de Denikin, Makhno foi um dos primeiros a chegar à Crimeia branca. Parece certo constatar que, a partir do fim de 1918-19, um espírito de autoridade, de intolerância, de estatismo excessivo prevaleceu cada vez mais no Comitê Central, eliminando cada vez mais brutalmente os princípios de Outubro. Nem Lênin nem Trotsky o contrariaram realmente, limitaram-se a se servir dele. Tnham razão que a salvação está na maior firmeza, na organização mais forte do novo Estado socialista, na disciplina mais rigorosa. Preciamos refletir, nada disso é incompatível com a democracia operária. Bem ao contrário. Mas os espíritos clarividentes do partido estão sobrecarregados, esgotados, exaustos: a revolução tem poucos homens. O sucesso dos métodos despóticos vem precisamente de que  estão ao alcance de qualquer um, e foram desde cedo impostos pelos arrivistas que formaram depois disso a burocracia.

Publicado em Serge, Victor; Trotsky, Leon. La lutte contre le stalinisme: correspondance inédite, articles. Paris : François Maspéro, 1977, p. 182-188. Tradução ao português: Emiliano Aquino.

segunda-feira, 19 de abril de 2021

Kronstadt

Victor Serge 

Em 5 de março deste ano, o massacre da insurgência do Soviet de Kronstadt em face do governo do partido bolchevique fez 100 anos. Espero que este seja apenas o primeiro de uma pequena série de textos (cartas, artigos, anotações no diário) de Victor Serge, nos anos 1937-38, sobre o soviet rebelde de Kronstadt, que traduzirei e publicarei aqui (por favor, aceito propostas de correção!). Este foi publicado em sua coluna « Les écrits et les faits » (Os escritos e os fatos), em La révolution prolétarienne, a 10 de setembro de 1937. Os termos entre colchetes se encontram na prórpia edição da Maspéro.

Veja também: 

Os escritos e os fatos (La révolution prolétarienne, a 25 de outubro de 1937) 

Sobre Kronstadt em 1921 e outros assuntos (Révolução Prolétarienne25 de agosto de 1938) 

Kronstadt 1921. Defesa de Trotsky. Resposta a Trotsky. (La Révolution prolétarienne25 de outubro de 1938)  

Victor Serge e o totalitarismo stalinista (Vídeo em Subversivídeos sobre Victor Serge)

 


Ataque do Exército Vermelho à fortaleza insurrecta de Kronstadt, no início de março de 1921, quando o gelo já derretia.

Respondendo a um jornalista alemão que o havia interrogado sobre esse assunto, Leon Davidovitch Trotsky publica no Boletim de Oposição Bolchevique-leninista russo (número de julho de 1937) uma carta muito curta sobre a questão da Insurreição de Kronstadt de 1921 e sobre Makhno. Ida Mett respondeu a ele aqui mesmo apresentando novas questões muito judiciosas. Ninguém, a não ser Trotsky, pode dar-nos um dia o grande livro histórico sobre os anos mais duros e mais memoráveis da revolução que nos é necessário a todos para esboçar o balanço dessa imensa experiência. Nós somos numerosos a aguardar e a desejar algo concebido um pouco num espírito crítico, talvez autocrítico... E é por isso que as poucas linhas publicadas pelo Boletim de Oposição me parecem hoje insuficientes e injustos sob diversos pontos de vista. "Resta [a Kronstadt], escreve Trotsky, a massa cinzenta, com grandes pretensões, não disposta a sacrifícios pela revolução. O país passava fome. Os marinheiros de Kronstadt exigiam privilégios... O movimento tinha, assim, um caráter contrarrevolucionário e, tendo os marinheiros apoderado-se da fortaleza, não se tinha outra opção que os conter pela força”. Eu estava em Petrogrado nesse momento, colaborando com Zinoviev; eu vi os acontecimentos de perto; eu li muito atentamente em sequência a coleção dos Izvestia do soviet de Kronstadt insurrecto. É verdade que o país passava fome; seria mesmo verdadeiro dizer que o país estava no limite de suas forças, que ele todo morria literalmente de fome. Mas é inexato que os marinheiros de Kronstadt exigissem privilégios; eles reivindicavam para as cidades em geral a supressão das barreiras policiais (zagraditelnye otriady) que impediam a população de se reabastecer em seus campos por seus próprios meios; mais tarde, quando se viram engajadas em um combate mortal, eles formularam uma reivindicação política extremamente perigosa nesse momento, mas [uma reivindicação política] geral, sinceramente revolucionária e, portanto, desinteressada: "soviets livremente eleitos".

Teria sido fácil evitar a sublevação escutando as reclamações de Kronstadt, discutindo-as; até mesmo satisfazendo aos marinheiros (teríamos a prova disso em pouco tempo). O Comitê Central cometeu o enorme erro de lhes enviar Kalinine, que se conduzia já como um burocrata incapaz e duro, que soube apenas ameaçar, levando vaias. Teria sido fácil, mesmo quando a batalha já tinha começado, evitar o pior: bastaria aceitar a mediação oferecida pelos anarquistas (Emma Goldman e Alexandre Berkman, notadamente) que tinham um contato seguro com os insurrectos. Por razão de prestígio, por excesso de autoritarismo, o Comitê Central se recusou a isso. Em tudo isso, foi enorme a responsabilidade de Zinoviev, presidente do soviete de Petrogrado, que enganou toda a organização do partido, todo o proletariado da cidade, toda a população nos anunciando que "o general branco Kozlowski tinha se apoderado de Kronstadt por traição”. Teria sido fácil, humano, mais político e mais socialista, após a vitória militar conquistada sobre Kronstadt por Vorochilov, Dybenko, Toukhatchevski, não recorrer ao massacre... O massacre que seguiu foi abominável.

As reivindicações econômicas de Kronstadt eram de tal modo legítimos, tão pouco contrarrevolucionárias na realidade, tão fácil de satisfazer que, no momento mesmo em que se fuzilavam os últimos amotinados, Lênin satisfazia essas reivindicações adotando a "nova política econômica"... A NEP lhe foi imposta pelas sublevações de Kronstadt, de Tambov e de outros lugares. Pois é preciso dizer: a clarividência de Lênin e do Comitê Central estava terrivelmente frágil havia vários meses; o Comitê Central não queria ver o que o país inteiro sentia e sabia: que o comunismo de guerra tinha se tornado um impasse em que não se podia viver.

Trotsky havia compreendido isso um ano antes. Desde fevereiro de 1920, ele propunha ao Comitê Central um conjunto de medidas suprimindo as requisições de grãos e estabelecendo uma nova política econômica. Lênin as recusou. Trotsky recuou. Seu erro iria custar muito sofrimento e sangue ao povo russo. Por que não o dizer? Não temos nenhuma necessidade da lenda mentirosa de um Lênin infalível.

Uma vez a batalha engajada entre a Kronstadt vermelha e o governo soviético, a questão se punha nesses termos: qual das duas forças em luta representava melhor o interesse superior dos trabalhadores? Duas cegueiras se chocavam em realidade. Os condutores da insurreição, anarquistas e socialistas revolucionários de esquerda, esperavam uma "terceira revolução" contra a ditadura do partido. Eles não viam – o que, contudo, estava evidente – que o país estava esgotado, sua vanguarda revolucionária estava já dizimada, não tinha mais nem os recursos morais nem os recursos materiais, nem os homens nem as ideias de uma nova revolução mais socialista. Eles desejavam desencadear os elementos de uma tormenta purificadora, mas, em realidade, teriam podido apenas abrir as portas a uma contrarrevolução, camponesa de início, da qual teriam prontamente tomado partido os brancos e a intervenção estrangeira. (Pilsudski se preparava para lançar seus exércitos sobre a Ucrânia). Kronstadt insurrecta não era contrarrevolucionária, mas sua vitória teria conduzido infalivelmente à contrarrevolução. A despeito de seus defeitos e de seus abusos, o partido bolchevique é nesse momento a grande força organizada, inteligente e segura na qual era preciso, apesar de tudo, confiar. A revolução não tem outra armadura e não é mais suscetível de se renovar a fundo. Era como pensávamos nós, comunistas de primeira linha, que ouvíamos tão claramente ranger toda a estrutura do prédio...

Publicado em Serge, Victor; Trotsky, Leon. La lutte contre le stalinisme: correspondance inédite, articles. Paris : François Maspéro, 1977, p. 177-181. Tradução ao português: Emiliano Aquino. 

terça-feira, 13 de abril de 2021

Até o fim do mundo: notas sobre um golpe

Este artigo, de autoria de Soe Lin Aung foi publicado no blog do Coletivo Chuang em 5 de fevereiro deste ano, alguns dias após o golpe de 1º de fevereiro. Esta é uma tradução Google revisada.

 

"A China já está investindo pesadamente em vários grandes projetos de infraestrutura em Mianmar. O governo chinês provavelmente terá como objetivo levar esses projetos adiante, independentemente da liderança política de Mianmar. Essa relação seria ameaçada apenas se os militares de Mianmar decidissem romper os laços com a China (altamente improvável), e não o contrário".



“Não estaremos satisfeitos até o fim do mundo”

Ao cair da noite em Yangon esta semana, a cidade ecoava todas as noites com o som de residentes batendo panelas e frigideiras e motoristas buzinando - barulho para afastar os maus espíritos. Em Mandalay, trabalhadores médicos se reuniram em formação, seus rostos mascarados iluminados por lanternas de telefones. Eles cantaram o hino da revolta de 1988, Kabar Makyay Bu, cujo título era uma promessa de luta sem fim contra o regime militar: “Não estaremos satisfeitos até o fim do mundo”. Enquanto os relatos de prisões aumentavam esta semana, ativistas e líderes estudantis enviaram apelos para que as pessoas fossem às ruas. Os militares decidiram encerrar o Facebook - um meio-chave de comunicação em Mianmar - enquanto amigos ainda circulavam mensagens sobre protestos, manifestações e outras formas de resistência. Um amigo conseguiu entrar em contato comigo: “Vamos lutar o máximo que pudermos”, disseram eles.

As notícias cresceram lentamente, diminuíram gradualmente e, de repente, aceleraram: na manhã de segunda-feira, os militares de Mianmar lançaram um golpe de Estado. Em uma série de ataques matinais, os militares detiveram a líder civil de fato de Mianmar, Aung San Suu Kyi; as principais figuras de seu gabinete e partido, a Liga Nacional para a Democracia (LND); e um número crescente de artistas e ativistas que não faziam parte do governo ou da LND. Várias horas depois, os militares usaram sua rede de televisão para declarar estado de emergência de um ano durante o qual o general Min Aung Hlaing - o comandante-em-chefe dos militares - governaria. O golpe aconteceu poucas horas antes de o parlamento recém-eleito do país se reunir pela primeira vez desde a eleição de novembro de 2020, que a LND havia vencido de forma esmagadora.

As especulações sobre um golpe cresceram antes de desaparecer. Durante meses, o partido político apoiado pelos militares de Mianmar, o Partido da União para o Desenvolvimento e Solidariedade (PUDS), lançou dúvidas sobre a recente eleição, alegando cerca de 90.000 casos de fraude eleitoral relacionados a listas de votação e carteiras de eleitores. Os partidos políticos que representam os principais grupos de minorias étnicas de Mianmar também levantaram objeções. Antes da votação, a Comissão Eleitoral da União (CEU) cancelou a eleição em partes da região de Bago, bem como nos Estados de Kachin, Kayin, Mon, Shan e Rakhine - todas as áreas de minorias étnicas onde, disse a CEU, o conflito armado impedia eleições livres e justas. Em 26 de janeiro, um porta-voz militar chegou a alertar sobre um possível golpe caso as alegações eleitorais não fossem abordadas. Dois dias depois, a CEU rejeitou as alegações dos militares. A ONU e várias embaixadas ocidentais então levantaram preocupações, após as quais os militares foram vistos como recuando de sua ameaça, prometendo defender a Constituição de 2008 e “agir de acordo com a lei”. A trégua foi breve. Na madrugada de segunda-feira [1º de fevereiro], com o golpe ocorrendo, o serviço de telefone e internet foi cortado, lojas fecharam as portas, bancos e aeroportos fecharam e alguns jornalistas se esconderam.

Amigos e familiares descrevem uma atmosfera tensa: repleta de possibilidades, mas também ameaçadora. Como um general anterior infame ameaçou em 1988, “O Exército não tem tradição de atirar para o ar. O exército atira para matar”. (E eles mataram milhares naquela época.) Um parente mais velho, contatado esta semana por telefone após repetidas tentativas da Tailândia, disse que não queria falar muito - apenas que, com algumas lojas fechadas, eles estão preocupados que possa ficar difícil comprar comida . Um amigo envolvido em atividades políticas me enviou uma mensagem dizendo que eles estão fugindo, mas estão seguros. Alguns de nossos amigos foram presos, explicaram; outros estão se escondendo à medida que o círculo de pessoas detidas se expande para a sociedade civil e as artes. “É uma sensação muito dolorosa”, disseram eles. Os trabalhadores médicos começaram logo. Nas horas que se seguiram ao golpe, funcionários de hospitais de todo o país fizeram apelos à desobediência civil em massa, que começou com sua própria série de paralisações no trabalho . Seu grupo no Facebook Movimento de Desobediência Civil ganhou mais de cem mil membros logo após o lançamento, antes que os militares fechassem o Facebook. Ainda assim, as expectativas são altas para distúrbios nos próximos dias.


Chegaram declarações de solidariedade da Tailândia. O Movimento Progressista, um grupo proeminente nos protestos recentes da Tailândia, emitiu uma declaração condenando os golpes como uma “praga” na Tailândia e em Mianmar. Eles clamavam por um futuro em que “o poder realmente pertença ao povo”. A União de Estudantes de Ciência Política da Universidade de Chulalongkorn também divulgou um comunicado - clamando pelo retorno imediato ao governo civil em Mianmar. No norte da Tailândia, cartazes podem ser vistos circulando nas redes sociais com slogans de protesto tailandeses escritos em birmanês - “A ditadura deve morrer, viva o povo”. No nordeste da Tailândia, ativistas pela democracia foram mais contundentes com sua campanha #SaveMyanmar, queimando uma efígie do [General Chefe da Junta Militar] Min Aung Hlaing nas ruas. Mianmar também foi formalmente (ironicamente) convidado para o muito elogiado #MilkTeaAlliance, que une ativistas jovens em Hong Kong e na Tailândia.

Nos campos Rohingya em Bangladesh, a situação é menos simples. Alguns Rohingya acreditam que [a Presidenta depoosta] Aung San Suu Kyi está essencialmente recebendo o que merece - como uma covarde que traiu os Rohingya em sua hora de necessidade. Outros são mais generosos. O poeta Rohingya Mayyu Ali pediu solidariedade contra os militares, relembrando as lutas de 1988.

Com Mianmar em turbulência, os relatos da mídia se concentraram no contexto imediato da disputa eleitoral. As análises iniciais sugeriram pouco mais do que que os militares, insultados e alarmados com sua exibição eleitoral, estão reafirmando o poder da única maneira que conhecem. Muito - muito - debate se concentrou na suposta racionalidade ou irracionalidade dos movimentos de Min Aung Hlaing, especulando sobre suas maquinações secretas e orgulho eleitoral ferido. Infelizmente, essa suposição psicologizante é muito típica das pressuposições liberais dos observadores de Mianmar, promovendo um modo de análise individual de cima para baixo, que observa o palácio, com a exclusão de fatores estruturais.

Quatro linhas de análise podem sugerir uma abordagem mais produtiva

Em primeiro lugar, o golpe é sem dúvida uma surpresa. De uma certa perspectiva, os militares não precisaram lançar um golpe; já detém considerável poder político e econômico, apesar de ter permitido a formação de um governo formalmente civil em 2011, após décadas de regime militar absoluto. Na dispensa pós-2011, os militares reservaram um quarto dos assentos para si no parlamento, o suficiente para evitar quaisquer emendas à constituição de 2008, que eles próprios redigiram em grande parte para proteger sua própria posição. Três ministérios principais permaneceram sob controle militar exclusivo, incluindo até mesmo o principal órgão administrativo do país até que foi colocado nominalmente sob controle civil no final de 2018E talvez o mais importante, a estatura econômica dos militares cresceu substancialmente desde o início da década de 1990, quando uma mudança controlada em direção a uma economia de mercado encontrou generais, seus comparsas e empresas de controle militar assumindo posições cada vez mais fortes no setor privado.

Tenho argumentado (junto com Stephen Campbell) que esta dispensação foi melhor não compreendida em termos de democratização, mas como uma diarquia civil-militar mistura liberalismo e autoritarismo. Em 2015, crucialmente, os generais dependiam menos do controle político formal para exercer o poder, agora que haviam reforçado sua estatura econômica. Daí sua disposição de aceitar - até mesmo avançar - um pouco de democracia liberal, que enriqueceu ainda mais os generais à medida que as empresas ocidentais se tornaram mais dispostas a investir. Argumentos mais amplos sugerem que um pacto de elite em evolução, ou bloco hegemônico, juntando-se à LND e aos militares se mostrou mutuamente benéfico, pelo menos economicamente.

Na medida em que essas afirmações explicam a retirada qualificada dos militares do poder político formal, elas agora precisam ser reexaminadas. O que está em jogo não é necessariamente uma autonomia repentina do político, como se os militares estivessem se agarrando ao poder político isoladamente de sua força econômica. No entanto, a relação precisa entre a política e a economia pode precisar ser reavaliada. Notavelmente, os generais agora reivindicam o poder político de uma posição de domínio econômico contínuo. Ao mesmo tempo, a economia de Mianmar está em declínio há vários anos. Fortes números de crescimento econômico acompanharam o período pós-2011 até cerca de 2017, após o qual a crise Rohingya e o ressurgimento dos conflitos nos Estados de Kachin e Shan ajudaram a impulsionar um declínio econômico acentuado. Como disse uma conta em 2019:

Turistas ocidentais que gastavam muito estavam se afastando em massa, preocupados com as violações dos direitos humanos. A burocracia estava obstruindo os negócios e os investimentos, e o país continua um pesadelo logístico. [...] está claro que a Liga Nacional para a Democracia de Aung San Suu Kyi estava cronicamente mal preparada para o governo e falhou notavelmente em controlar a economia.

Portanto, uma possibilidade: o bloco hegemônico pós-2011 já fez bem em enriquecer as elites civis e militares, mas com uma lógica econômica decrescente a lógica mútua do pacto não se sustentou mais. Seria difícil elevar esse fator acima de todos os outros - pelo menos neste ponto - mas poderia facilmente constituir um fator, e um fator importante, que tornou mais precário um arranjo outrora simbiótico. O insight central não precisa ser controverso: a dispensa pós-2011 foi simplesmente histórica. À medida que as condições materiais mudaram, também mudaram as relações de força que alimentavam.

Uma segunda linha de análise é que se o golpe provoca alguma surpresa diante do poder que os militares já detinham, também não é surpreendente exatamente por esse motivo: já estava claro que, em última instância, são os militares que dominam. O golpe simplesmente codifica, ao consolidar, as relações de poder existentes. Essa posição pode ser mais óbvia do ponto de vista das fronteiras de Mianmar, onde grupos de minorias étnicas estão sujeitos a implacáveis ​​campanhas de contra-insurgência há décadas. Saw Kwe Htoo Win, vice-presidente da União Nacional Karen, tinha este dizer: “Não importa se os militares dão um golpe ou não, o poder já está em suas mãos. Para nós, de nacionalidades étnicas, quer a LND esteja no poder ou os militares tomem o poder, ainda não fazemos parte dele. Nosso povo é quem continuará a sofrer com esse chauvinismo”.



Essa perspectiva tem outro ângulo. A suposta relação entre a abertura política e econômica - o assunto preferido dos transitologistas de grupos de reflexão - não parece mais tão clara. Em vez disso, vemos uma transição capitalista de décadas entrelaçada com uma variedade de formas políticas, da ditadura à diarquia, desta à ditadura novamente. Mesmo uma rápida olhada nos vizinhos de Mianmar - China, Tailândia, Cingapura - sublinha a realidade de que o capitalismo dificilmente garante a democratização.

Uma certa configuração do poder burguês se destaca aqui. Tanto em Mianmar quanto na Grande China, por exemplo, um aparato estatal centralizado - os militares de um lado, uma burocracia de partido-Estado do outro - navegou em um relacionamento tenso com frações burguesas separadas, algumas das quais são politicamente liberais e mais ligadas ao capital ocidental. O que significa quebrar esse alinhamento? Em Mianmar, os militares não terão mais o mesmo acesso ao capital ocidental. Ainda assim, a longa transição capitalista de Mianmar sempre foi alimentada muito mais pelo capital do Leste e Sudeste Asiático, variando de seu setor de vestuário oscilante a suas agroindústrias crescentes e as principais formas de extração de recursos naturais (nomeadamente petróleo e gás, especialmente reservas de gás offshore agora fluindo para Tailândia - e oleodutos duplos e gasodutos fluindo para Yunnan, China). Assim, de muitas maneiras, as condições centrais da acumulação de capital permanecem em vigor, mesmo que a burguesia liberal doméstica enfrente uma maior exclusão de seus despojos. A agricultura de semi-subsistência continuará a sofrer erosão nas vastas áreas rurais e nas fronteiras montanhosas de Mianmar, à medida que a mão de obra precária e de baixos salários se expande nos centros urbanos.

No entanto, mesmo as perspectivas de investimento chinês não são totalmente claras, embora provavelmente estejam sujeitas a menos interrupções do que projetos ocidentais mais tênues. Por um lado, a resposta muda do governo chinês ao golpe - observando uma “remodelação do gabinete”- reflete uma tendência consistente de enquadrar a agitação política simplesmente como uma questão de assuntos internos. O investimento chinês sempre foi considerável durante os anos de ditadura militar de Mianmar. Do lado chinês, não há razão para esperar qualquer hesitação séria em enfrentar a nova ditadura militar. Por outro lado, o governo da LND conseguiu desenvolver relações muito fortes com a China, e os militares de Mianmar há muito veem a China apoiando insurgências nas fronteiras chinesas de Mianmar, desde os mais de quarenta anos de rebelião do Partido Comunista da Birmânia aos grupos armados que surgiu em seu rastro. Há alguma possibilidade (embora pequena) de os militares presumirem que a dependência de fato da China pode não ser mais totalmente garantida. Independentemente disso, a China já está investindo pesadamente em vários grandes projetos de infraestrutura, desde a represa Myitsone no norte de Mianmar - que a China pode pressionar os generais a retomar - até o Corredor Econômico China-Mianmar no oeste de Mianmar, parte da Iniciativa Belt and Road (BRI). O governo chinês provavelmente terá como objetivo levar esses projetos adiante, independentemente da liderança política de Mianmar. Essa relação seria ameaçada apenas se os militares de Mianmar decidissem romper os laços com a China (altamente improvável), e não o contrário.

A terceira linha de análise já emergiu: a visão da fronteira. A discussão das alegações de fraude eleitoral dos militares - amplamente vistas como infundadas - em grande parte ofuscou o fato de que a CEU simplesmente cancelou a eleição em muitas áreas de minorias étnicas. O que está em questão é a relação das fronteiras com o conflito, o capital e as transformações políticas nas últimas décadas. Desde a década de 1990, o capitalismo de fronteira nas vastas áreas de fronteira de Mianmar - investimento em mineração, madeira e agroindústria como plantações de óleo de palma, principalmente de capitalistas tailandeses, chineses e das planícies de Mianmar - incorporou as elites políticas e econômicas de minorias étnicas dentro da transição capitalista de Mianmar, em grande parte terminando a ameaça outrora existentes de grupos armados étnicos ao Estado de Mianmar. Indiscutivelmente esta foi a dinâmica decisiva que possibilitou as reformas políticas e econômicas do período pós-2011.

É possível que, com tanto foco na disputa eleitoral militar, um desdobramento mais amplo da trajetória política e econômica de Mianmar esteja se aproximando? Se a incorporação das fronteiras étnicas por meio do capitalismo de fronteira acabou com as ameaças existentes ao Estado de Mianmar, então a privação de direitos nas terras fronteiriças - uma ruptura com essa dinâmica de incorporação - sugere um potencial próximo a um ciclo histórico que reforçou a própria possibilidade do Estado por meio de uma longa transição capitalista. À medida que o golpe avançava, também surgiam relatos sobre confrontos militares tomando forma em Shan e Kayin, no leste do Estado de Mianmar, sinalizando um possível retorno ao conflito aberto. Então, novamente, apesar dos cancelamentos eleitorais, seria um erro superestimar o grau em que as minorias étnicas, além de suas elites políticas e econômicas, se entendiam como emancipadas em primeiro lugar. Além disso, a extração de recursos [naturais] e a agroindústria nas terras fronteiriças - pilares do capitalismo de fronteira - enfrentam pouca ameaça no contexto do golpe, estando mais conectadas a frações militares do que frações burguesas liberais da classe dominante de Mianmar. A dinâmica incorporativa que eles dirigem parece determinada a continuar.

Em quarto lugar, deve-se acrescentar que Aung San Suu Kyi parece ter falhado, decisivamente, em sua tentativa de construir e manter relações com os militares. Mais notoriamente, Suu Kyi compareceu ao Tribunal Internacional de Justiça de Haia para defender Mianmar contra as acusações de genocídio cometidas pelos militares contra os Rohingyas de Mianmar. Observadores externos viram sua aparição como um expediente político - até mesmo cínico - para proteger os militares da condenação internacional a fim de ganhar o favor dos generais. Seu objetivo, em última análise, era construir relações fortes o suficiente com os militares para que seu partido pudesse aprovar emendas à constituição de 2008 que forçariam mais completamente os militares a abandonar a política formal. Em vez disso, ela se encontra mais uma vez prisioneira dos militares.

As razões de seu fracasso serão debatidas ad nauseamAs discussões até agora sugerem superficialmente que os militares simplesmente ficaram com ciúmes de sua popularidade e sucesso eleitoral contínuos. Diz-se que ela "superou-os na competição”, por exemplo, nas redes sociais, quando se trata de expressar o sentimento anti-Rohingya. Uma análise mais sofisticada será necessária. Provisoriamente, no entanto, nota-se que o fascínio pelas relações civis-militares (leia-se: relações Suu Kyi e Min Aung Hlaing), abstraído das forças políticas e econômicas maiores, muitas vezes se reduz à velha observação de palácio que reduz a política à personalidade, a estrutura à contingência individual. A questão não é que esses líderes não importem, mas simplesmente que, mesmo quando os líderes fazem história, não é sob condições de sua própria escolha. O tempo para a psicologização das intrigas palacianas acabou. A hora de resistência está aqui. E não ficaremos satisfeitos até o fim do mundo.

Tirem seus filhos surdos das escolas de ouvintes!

Foto: O Globo Esse título parece uma palavra de ordem, mas não é. É um grito angustiado.  Todos os anos as três escolas que em Fortaleza ofe...